Thursday 27 October 2011

Por uma sociologia sem fronteiras_Texto & Fotos


O Prof. Luis de Brito, investigador do IESE, proferiu no dia 12 de Outubro, a Primeira Aula Pública de Sociologia, na Faculdade de Medicina, dissertando sobre o tema “Por uma Sociologia sem Fronteiras” (pdf). Estiveram presentes neste evento, organizado pela Associação Moçambicana de Sociologia, académicos, estudantes, membros associados e convidados. (veja as fotos)

Friday 14 October 2011

AGRADECIMENTO

Prezados membros e simpatizantes da A.M.S
A direcção da A.M.S vem por este meio agradecer a vossa presença, maciça, na Primeira Aula Pública de Sociologia (A.P.S), e na cerimónia de homenagem ao Professor Luís de Brito, que decorreu na Sala Magna da Faculdade de Medicina da Universidade Eduardo Mondlane no do 12 de Outubro de 2011 das 14 as 17h. A vossa presença foi digna do nosso maior apreço e contribui de forma incomensurável para o sucesso do evento. Como podereis imaginar, preparar um evento daquela envergadura requereu um esforço logístico titânico.
Gostaríamos de aproveitar esta ocasião para exortar aos membros e simpatizantes a regularizarem as suas quotas. Poderão fazê-lo através da conta da A.M.S no BCI: 30482930. Informamos também que a versão escrita e revista da aula será publicada em forma de livro para a sua disseminação. Os membros com quotas regularizadas terão acesso ao livro com um preço bonificado.
A A.M.S através da sua direcção tem estado a receber cumprimentos, elogios e até sugestões de várias individualidades pela iniciativa. Sentimo-nos bastante lisonjeados e encorajados pelo gesto. Gostaríamos, entretanto, de sugerir que aquelas pessoas que ainda estiverem interessadas em fazer algum tipo de comentário, sugestão, crítica e ou elogio o façam através do seguinte endereço, sociologia.mocambicana@gmail.com.
 Se acharem que o  comentário pode ser partilhado por todos então poderão solicitar a sua publicação no blog da A.M.S, sociologia-mocambicana.blogspot.com
Melhores cumprimentos,
A Direcção da A.M.S





Tuesday 4 October 2011

Primeira Aula Pública de Sociologia da A.M.S

Breve Nota Explicativa da APS
Por Uma Sociologia Sem Fronteiras é o título da primeira aula pública de sociologia A.P.S﴿, da Associação Moçambicana de Sociologia A.M.S﴿, a ser proferida pelo Prof. Luís de Brito, no dia 12 de Outubro de 2011, na Faculdade de Medicina da Universidade Eduardo Mondlane. A direcção da A.M.S tem a honra e o prazer de convidar a comunidade de sociólogos, de/em Moçambique, académicos das diversas áreas disciplinares, políticos, a sociedade civil, e o publico em geral a participar desde evento inédito e singular na incipiente historia da sociologia no país. Jamais nos anais da história da sociologia em Moçambique teve lugar um evento análogo. Por esta razão, este momento carrega consigo um significado especial e singular para a A.M.S.
 O que é a A.P.S da A.M.S?
A APS é uma iniciativa da direcção máxima da A.M.S que procura reconhecer e distinguir publicamente individualidades e/ou entidades nacionais e/ou estrangeiras que se tenham destacado ao contribuir para o desenvolvimento da sociologia. A ideia principal é convidar um académico de reconhecido mérito na sociologia ou áreas afins à partilhar a sua formulação sociológica de um problema específico da disciplina ou identificado em torno de um tema. A aula pública, portanto, vai ser um evento público onde o orador convidado aborda os aspectos centrais da sua investigação sobre determinado assunto. Por norma, será dada preferência à sociólogos moçambicanos como forma de divulgar sua pesquisa e ideias à um público mais alargado.
Quem é Luís de Brito?                  
Conhecido pelos seus alunos simplesmente por professor Luís de Brito, Luís Manuel Cerqueira de Brito nasceu em Moçambique e concluiu seu bacharelato em História na Universidade Eduardo Mondlane, Maputo, em 1976. Neste mesmo ano, iniciou sua carreira académica integrando a equipe de pesquisadores que criou o Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane. Simultaneamente à pesquisa, especializou-se em Estudos de Desenvolvimento no Centro de Estudos Africanos, obtendo seu diploma em 1981. No ano de 1992, concluiu seu PhD na Université de Paris VIII. Actualmente é pesquisador permanente do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) de Moçambique. Para saber mais sobre o nosso orador siga a seguinte hiperligação,

Primeira Aula Pública de Sociologia da A.M.S 12/10/21011

Wednesday 21 September 2011

Primeira Aula Pública de Sociologia da A.M.S: Brevemente!

A Associação Moçambicana de Sociologia (A.M.S.) vem por este meio convidá-la/o a tomar parte da primeira Aula Pública de Sociologia. A APS é uma iniciativa da direcção máxima da AMS que procura reconhecer e distinguir publicamente individualidades e/ou entidades nacionais e/ou estrangeiras que se tenham destacado ao contribuir para o desenvolvimento da sociologia.

Este ano a A.P.S. será proferida pelo Prof. Doutor Luís de Brito, membro da A.M.S., e Professor Associado da Faculdade de Letras da Universidade Eduardo Mondlane (U.E.M.). A APS versará sobre o tema: “Por Uma Sociologia sem Fronteiras” e terá lugar no dia 12 de Outubro de 2011 na Faculdade de Medicina da U.E.M. no período compreendido entre as 14h e 17h, aproveitando-se a data para homenagear a todos os professores do país, e em particular os do Ensino Superior.

Tuesday 20 September 2011

Thursday 7 July 2011

AMS_EVENTOS

No âmbito do seu projecto “círculo de Sociologia” a Associação Moçambicana de Sociologia (A.M.S) convida a todos os seus membros e o público em geral a participar de um evento a ter lugar no dia 14 de Julho de 2011, pelas 14:30horas, no auditório da Biblioteca Central Brazão Mazula, campus universitário da Universidade Eduardo Mondlane localizada no .

O que é o círculo de sociologia?

O círculo de sociologia é uma iniciativa da direcção da A.M.S que visa juntar a comunidade de sociólogos e interessados num momento de “reflexividade”. A reflexividade é entendida, aqui, como a capacidade de indivíduos dialogarem com a sua própria sociedade. Eles interrogam a sociedade em que vivem; a sociedade coloca-lhes também questões. Nesse intercâmbio, os indivíduos transformam a sociedade e ela também os transforma. A sociologia, como ciência, exprime a reflexividade. É com base neste pressuposto simples da reflexividade que a A.M.S achou importante iniciar um círculo de interrogação sociológica da nossa sociedade. Acontece, porém, que a nossa sociedade não é uma entidade isolada. A prática da sociologia idem. Por isso, a perspectiva comparativa, o trazer olhares de fora sobre a nossa realidade e sobre outras realidades é um acto necessário e privilegiado.
O círculo de sociologia é portanto aberto à todas as pessoas interessadas na sociologia como um momento reflexivo.
Melhores cumprimentos
A direcção da A.M.S 
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Na próxima semana a A.M.S vai ter a honra de receber a visita de dois sociólogos Brasileiros. Trata-se dos Professores:

Remo Mutzenberg
Linhas de Pesquisa: Cultura Política, Identidades Coletivas e Representações Sociais; Teoria e Pensamento Social

Interesses: Discurso, Movimentos sociais, Democracia, Cidadania.



Professora Eliane Veras Soares
Linhas de Pesquisa: Cultura Política, Identidades Colectivas e Representações Sociais; Teoria e Pensamento Social.
Interesses: Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Pensamento Social no Brasil. No momento desenvolve pesquisa sobre os países africanos de língua portuguesa com ênfase no pensamento social e nas literatura africanas.

No âmbito da visita os dois professores vão proferir duas palestras. Exortamos a todos os membros e interessados a participarem dos dois eventos. Será uma oportunidade não só para debater assuntos de interesse comum, mas para estabelecer redes académicas. Como podereis notar, os temas das comunicações são bastante interessasntes e actuais.
TEMA I
"Dilemas intelectuais na América Latina: Florestan Fernandes e a sociologia no Brasil" -
ELIANE VERAS SOARES.
TEMA II
"Movimentos sociais e democracia: sentidos e perspectivas contemporâneas" -
REMO MUTZENBERG
Não FALTE e ajude-nos a divulgar.

Tuesday 21 June 2011

Sunday 5 June 2011

Erros de palmatória na pesquisa social

No dia 2 de Junho deste ano, um indivíduo chamado Javier Brandoli publicou um artigo no jornal espanhol El Mundo com o título “La condena de los ritos de iniciación sexual en Mozambique”. Vi referências e algumas análises suscitadas pelo texto nos blogues “Diário dum Sociólogo” e “Reflectindo sobre Moçambique”. Na página “Facebook” da UNICEF, entidade que é citada no artigo do jornal El Mundo como sendo a autora do estudo sobre o qual o texto se baseia, há uma referência à análise feita pelo Prof. Serra. Nessa referência a UNICEF indaga-se se a reacção deste sociólogo será um caso de relativismo cultural.
O artigo em questão, portanto o do jornal espanhol El Mundo, revela que no Norte de Moçambique, mais especificamente em Nampula e Zambézia, crianças do sexo feminino com idades compreendidas entre os 9 e 13 anos são tiradas da escola, fechadas em casa e iniciadas nos segredos da actividade sexual. Essa iniciação consiste em aprender a dar prazer ao homem e envolve práticas horríveis como a dilatação da vagina bem como o uso de substâncias que tornam a vagina mais pequena, sempre na óptica do prazer masculino. O estudo que proporcionou estes dados ao jornal analisa estas práticas de iniciação como uma manifestação do papel subalterno da mulher em Moçambique bem como da força de tradições culturais. Com efeito, a iniciação é feita por mulheres (baptizadas de “damas de horror” no jornal em referência ao conceito de “dama de honor”) que, segundo o jornal, também foram vítimas destas práticas quando ainda mais novas.
A dependência do auxílio externo é uma coisa muito chata. Enquanto durar esta dependência, o nosso país vai sempre servir de caixa de ressonância para funcionários internacionais sempre à procura de novos mercados para o que sustenta as suas organizações. Estamos perante a lógica implacável de quem veio ao mundo para “ajudar” e, para o efeito, não pode fazer mais nada senão estar sempre atento a novas oportunidades. Não quero com isto dizer que os problemas que chamam a atenção destes funcionários internacionais não sejam reais. Muitas vezes até são. O que me preocupa é a enorme capacidade que esses funcionários e suas instituições têm de ampliar problemas, tornando-os maiores do que são e fazendo uso de generalizações que dificilmente dão conta do fenómeno em análise. Pessoalmente, tornei-me sensível a este problema durante a minha experiência de docência na UEM quando me dei conta de que a quase totalidade dos trabalhos que eu orientava sobre o HIV-SIDA dava como conjunto de factores que ajudavam a alastrar a doença a prática do “kutchinga”, “sexo-seco”, ritos de iniciação, etc. A impressão com que se ficava lendo estes trabalhos era dum país, cujas práticas sexuais se reduziam a estas coisas. Incrivelmente, mesmo os relatórios oficiais reproduziam este tipo de tolices.
Nós os sociólogos devemos estar atentos a estes problemas. O melhor é sempre fazer pesquisa tentando replicar o que os outros apuraram. Contudo, isso nem sempre é possível. Quando é assim e interessamo-nos pelo assunto devemos, então, pelo menos ler esses estudos de forma crítica. Infelizmente, não tive acesso ao estudo citado pelo jornal espanhol pelo que não posso tecer considerações de grande nota sobre as conclusões a que ele chegou. Quem tiver acesso ao relatório pode me enviar uma cópia. Melhor ainda, quem tiver acesso pode exercitar o seu dom crítico interpelando-o a dois níveis principais que passo a apresentar para depois tecer algumas considerações de âmbito ético.
Níveis de plausibilidade
O primeiro nível tem a ver com um problema que tenho estado a combater há vários anos, nomeadamente o problema da generalização grosseira. A julgar pelo artigo do jornal El Mundo o estudo em causa peca pela generalização. Fala-se de pais em Nampula e Quelimane que fazem algo que é fortemente praticado nas zonas rurais de Moçambique. Qualquer sociólogo (e, de forma geral, cientista social) deve desconfiar deste tipo de informação. Sempre que alguém diz “em Moçambique acredita-se que...” o sociólogo deve dizer “alto! Quem em Moçambique?”. Sempre que alguém afirma “os pais em Nampula dizem que...” o sociólogo deve dizer “pára aí! Que pais em Nampula?”. Sempre que alguém diz “meninas são obrigadas a...” o sociólogo deve dizer “espera aí! Que meninas são obrigadas?”. São perguntas muito simples que nos poderiam ajudar muito a conter algumas pessoas bastante apressadas nas suas conclusões.
E não só. Essas perguntas haviam de nos ajudar a obrigar certas pessoas a veicularem informações fundamentadas. Reparem que o que estou a dizer aqui não é que certas coisas não existam, por exemplo, ritos de iniciação nos moldes condenados pela UNICEF. De certeza que existem, o estudo não havia certamente de inventar essas coisas, por mais que isso seja no interesse da reprodução da UNICEF e das ONGs satélites que vivem dos seus financiamentos. O que estou a dizer é que um estudo que tira conclusões gerais – ou que sugere esse tipo de conclusões – não vale o papel sobre o qual foi escrito. É perca de tempo e de recursos. E um mau serviço à esfera pública. Quem são as pessoas em Nampula e na Zambézia que observam essas práticas? Que características de âmbito social é que essas pessoas apresentam? São católicos? Muçulmanos? Protestantes? Funcionários de colarinho branco? Desempregados? Idades compreendidas entre os 40 e 60 anos? Essencialmente mulheres? Níveis de escolaridade? Etc., etc. Sem estas informações, repito, o estudo não vale nada e, se Hobbes ainda estivesse em vida (ele tinha pouca paciência com pseudo-ciência), teria recomendado que o estudo fosse queimado. A Inquisição teria recomendado que os autores fossem queimados. Eu recomendo que todo o sociólogo se distancie deste tipo de charlatanismo que anda a sujar a ciência.
O segundo nível é extremamente insidioso. Tentei no meu defunto blogue (www.ideiascriticas.blogspot.com) alertar contra o problema envolvido nesse nível, nomeadamente o problema da plausibilidade. O que é plausível, sociólogos moçambicanos, não é necessariamente correcto. A plausibilidade depende de muito mais do que o que o racionalismo na base da nossa actividade científica exige. Basta que todo o mundo creia que... para esse que ganhe o estatuto de verdade. A julgar pelo artigo no jornal El Mundo o estudo ganha a sua plausibilidade na base de dois truques retóricos. Um é uma espécie de argumento com base na mesircórdia. Este argumento (que é na verdade uma falácia) faz um apelo a uma circunstância que mete pena para reclamar razão. Neste caso específico trata-se da ideia de que as meninas estão a ser usadas para cimentar as estruturas opressoras do patriarcado em Moçambique. Pelo menos o artigo do jornal é contextualizado desta maneira (naquilo que a análise discursiva chama de “framing”), insinuando-se sobre o leitor na base dessa ideia. Portanto, as práticas não são apenas horríveis; os motivos na sua base também são extremamente problemáticos. O leitor é a favor da opressão da mulher? Não? Pois bem, não pode ficar indiferente à sorte das meninas de Nampula e Zambézia (no fundo até são as meninas de Moçambique, África...).
A outra manifestação da plausibilidade é o argumento “ad populum” (também uma falácia) que consiste no apelo à opinião geral: todo o mundo sabe que... Pois, todo o Moçambique sabe que em África existem crenças bizarras, logo, os relatos que chegaram aos ouvidos dos investigadores sobre os maus tratos a que são submetidas crianças do sexo feminino têm que ser verdade. Reparem, de novo, que não estou a dizer que não exista um pano de fundo de verdade nesses relatos. Estou a dizer que há diferença entre supor que um depoimento seja verdade e verificar se ele corresponde à prática social. No artigo do jornal El Mundo escreve-se que os ritos são quase sempre acompanhados pelo abandono da escola pelas raparigas, algo que não desagrada totalmente aos pais uma vez que eles não vêm com bons olhos a educação liberal que as escolas dão aos seus filhos. Aposto que isto é pura invenção do autor do artigo e, se não for, revela a extensão do problema do estudo na base do qual o jornalista escreveu o seu texto. Uma coisa que chama logo atenção é a natureza estrangeira da sua terminologia: “educação liberal” não é termo moçambicano, muito menos das camadas populacionais na mira deste estudo. De resto, a escola em Moçambique (apenas uma hipótese) não apresenta uma alternativa cultural tão fortemente vincada como é sugerido por esta passagem. Não ponho as mãos no fogo, mas lá está, este assunto teria que ser visto em articulação com grupos sociais específicos.
Portanto, sociólogos moçambicanos, ponham-se a pau!
Padrões culturais não são analíticos
Termino com algumas considerações de ordem ética. A UNICEF insinua no “Facebook” que o Prof. Serra (que iniciou uma análise que me parece perfeitamente legítima e equilibrada sobre o assunto) esteja a fazer recurso ao relativismo cultural. Esta insinuação mostra, mais uma vez, com que tipo de pessoas estamos a lidar naquela instituição e porque devemos prestar atenção. Acho esta insinuação profundamente irrelevante, mas reveladora do estilo analítico desse pessoal. Levantando o espectro do relativismo cultural distrai-se as pessoas do que está verdadeiramente em jogo nesta questão, nomeadamente a (falta de) seriedade na produção de conhecimento. É como se a UNICEF (isto é, quem mantém a página no Facebook) estivesse a dizer que quem tem dúvidas em relação ao estudo só pode ser movido pelo espírito de que tudo é aceitável desde o momento que se enquadre num sistema cultural. Mas a questão dos ritos não se pode resumir a isso, aliás, eu gostaria de chamar a atenção dos jovens sociólogos para evitarem este tipo de discussão estéril.
Há quem goste de nos manter sempre a discutirmos este tipo de assunto: é nossa cultura, não, não é nossa cultura! Os europeus também têm práticas deles e ninguém anda a condená-los por isso! E por aí fora. Isso é discussão estéril do ponto de vista da sociologia. O sociólogo devia partir duma interrogação simples para abordar este tipo de questão: quem observa certas práticas sociais e como as justifica? Só isso vai servir para nos trazer à consciência que a ideia de “cultura moçambicana” (ou africana, ou mesmo, o que é pior, “nossa cultura”) não é nada útil para abordar fenómenos sociais. Quem faz o quê em que circunstâncias e porque razão? Essa é a questão. Ou as questões! Curiosamente, uma leitura atenta do artigo do jornal El Mundo revela, neste sentido, um outro truque retórico do estudo. Esse truque consiste numa apresentação normativa de certas práticas. Por exemplo, o que as meninas são ensinadas a saber fazer é sistematicamente apresentado como um conjunto de práticas que têm como objectivo torná-las submissas. Assim, elas aprendem a manter a casa limpa, a lavar o orgão genital do parceiro terminado o acto sexual, e por aí fora. Agora reparem: posso apresentar essas coisas dessa maneira, como também posso apresentá-las como manifestação de valores culturais que dão primazia ao altruísmo. Sou contra tudo que cheira à opressão, mas o que mais me incomoda ainda é gente que a coberto duma instituição como a UNICEF anda aí numa de que os seus valores culturais proporcionam a única grelha válida de análise de seja o que for.
Sociólogos, fiquem atentos. Um dia vão ser chamados a repetir este tipo de estudos problemáticos.   
Colaboração: Prof. Elísio Macamo
Universidade de Basel, Suiça

Wednesday 18 May 2011

A peleja da Mulher Melancia com o Bispo Macedo em Moçambique




O Sociólogo Marílio Wane, membro da Associação Moçambicana de Sociologia (A.M.S), apresenta-nos mais uma reflexão interessante. Desta feita, trata-se da sua interessante análise  da relação Brasil – África. Uma relação ‘nada inocente se não fossem os interesses económicos do Brasil em relação ao continente africano e em especial os países de língua portuguesa’ Este texto é reproduzido com a devida vénia do Pambazuka News.

Este texto de Marílio Wane traz aos nossos leitores uma indagação interessante e nada inocente se não fossem os interesses econômicos do Brasil em relação ao continente africano e em especial os países de língua portuguesa. Afinal de contas, qual a relação entre a mulher melancia e o Bispo Macedo? Vejamos na leitura do texto como o sagrado e o profano se articulam dentro de um interesse multinacional brasileiro via uma grande rede de televisão.


No fim-de-semana de 12 e 13 de Março deste ano, a cidade de Maputo viveu um inusitado encontro entre o sagrado e o profano. Para animar a noite de sábado dos maputenses, a sensual Mulher Melancia apresentou-se no Coconuts, famosa casa de espectáculos da cidade, e no domingo, foi inaugurado o Cenáculo da Fé, o maior templo da Igreja Universal do Reino de Deus no continente africano. A princípio, os dois acontecimentos não teriam nenhuma relação um com o outro não fosse o fato de serem indicadores da massiva presença brasileira no cotidiano dos moçambicanos. Inclusive, a diferença de propósito existente entre os dois reflete a diversidade com que se manifesta essa mesma presença; se ao nível macro, já temos o grande capital brasileiro e acções de cooperação de Estado nas mais diversas áreas, este fim-de-semana nos deu ainda mais a dimensão microssocial, cotidiana, deste encontro de culturas.


Na dimensão do profano, a exibição da Mulher Melancia fazia parte das comemorações do carnaval na cidade, porém, deve se dizer que Maputo não tem uma tradição forte em relação a essa festa popular, sendo mais correto dizer que “carnaval” era muito mais uma forma de produzir um mote publicitário para atrair as pessoas. Aliás, a principal referência dessa festa para os moçambicanos é justamente a do Brasil, a que tem acesso através da televisão. Para os que não conhecem, “Mulher Melancia” é uma personagem representada pela dançarina brasileira Andressa Soares, cujo nome artístico é uma referência à sua bunda avantajada. Assim, a principal atração desta jovem é o apelo erótico explícito do seu show, tanto nas coreografias quanto nas letras das músicas, tendo sido bastante conhecida em seu país de origem pelo hit da “Dança do Créu”, lançado no verão de 2007/08.


Já na dimensão do sagrado, a inauguração de um templo de grandes dimensões da Igreja Universal do Reino de Deus só veio coroar a atuação incisiva desta instituição no país, a partir de fins da década de 1990. A solenidade do evento foi marcada pela missa ministrada pelo próprio Bispo Edir Macedo, fundador e principal líder da igreja, sendo depois recebido pelo Presidente da República, Armando Guebuza, em audiência oficial. Este fato, por si só dá mostras do prestígio de que a instituição goza entre as próprias autoridades moçambicanas, pretensamente por contribuir para o “desenvolvimento moral” da sociedade. Entretanto, o evento foi marcado por uma tragédia, pois duas pessoas morreram asfixiadas e outras quatro ficaram gravemente feridas devido à superlotação no templo. Segundo dados oficiais, havia 10 mil pessoas num espaço onde só caberiam 3 mil.


Deus e o Diabo no país da Marrabenta·

A presença de atrações como Mulher Melancia não é extatamente uma novidade para os maputenses. Ainda que não tenham havido muitas do gênero nos últimos tempos, em 2004, a “Tiazinha” – personagem encarnado pela “modelo e atriz” brasileira Suzana Alves – apresentou-se, também em meio às comemorações do carnaval. Assim como Andressa e seu personagem, Suzana também se valia da sensualidade como principal atrativo para o público, se bem que de forma bem menos explícita. No seu contexto originário, este tipo de atrações costuma dividir opiniões quanto ao seu suposto valor artístico. De um lado, há os que dizem que se trata de espetáculos apelativos de gosto duvidoso e não só, que significam um rebaixamento do papel da mulher na sociedade através da exploração comercial do(s) seu(s) corpo(s) e de outro lado, há os que apreciam o aspecto lúdico do erotismo e consideram como algo que não deve ser levado tão a sério.

No contexto de Moçambique, a princípio, as duas “cantarinas” provocam um choque cultural, não tanto por abordar a sensualidade ou o erotismo, dado que a música popular moçambicana contém esses elementos de sobra (tanto nas canções quanto nas danças). A diferença encontra-se na forma: o que atrai o público, jovem em sua maioria, e que certamente escandaliza os mais velhos, é a quase total nudez apresentada pelas cantarinas. A respeito disso, um dos poucos relatos e/ou resenhas “críticas” sobre a apresentação da Mulher Melancia foi feito por um brasileiro residente no país, em seu blog (blogdomoscou.blogspot.com), donde destaca-se esta passagem: “(...) ela queria fazer a segunda parte da apresentação de bikini, tipo tirar a roupitcha (sic) vermelha e dançar com o conjunto preto que estava por baixo, só que aki (sic) em Moçambique isto já é demais... o cara da organização, em off, censurou a idéia ainda durante a apresentação. Neste aspecto, acho que o Brasil esta avançado ‘até demais’”.

É justamente aí que se dá o choque cultural: apesar de o público moçambicano já estar habituado à nudez exaustivamente veiculada pela televisão brasileira neste tipo de atrações, a sua execução “ao vivo” abala sensivelmente os valores locais. Além do mais, o próprio blogueiro coloca outra questão muito importante em relação à sua própria cultura, qual seja, o tênue limite entre a liberalidade e a libertinagem. Questão essa que adquire novos contornos a partir do momento em que o Brasil exporta determinados valores que atentam contra o pudor em outras culturas. Aqui, há uma questão mais ampla sobre o impacto desta televisão no cotidiano local, que não se restringe só ao erotismo ou sensualidade explícitos. Muitos outros temas abordados na vasta programação a que se tem acesso, como por exemplo, a homossexualidade, a violência, as drogas, a corrupção, etc. Podem trazer distorções significativas quando “aplicados” ao contexto moçambicano. Importante frisar que trata-se de uma relação desigual, onde não há exatamente uma troca de informação entre os dois países, o que ajudaria numa melhor contextualização dos conteúdos veiculados.


Num primeiro momento, “sagrado” e “profano” são termos antitéticos e até mesmo opostos, o que no nosso caso em questão, nos leva a pensar que a vinda da Mulher Melancia nada tenha a ver com a inauguração de um templo religioso. Mas talvez seja melhor pensá-los como termos dialécticos, envolvidos numa relação em que a existência de um sugere a do outro. Esta perspectiva pode nos ajudar a pensar naquilo que os dois eventos têm em comum: ambos estão ligados à presença da televisão brasileira em Moçambique, dado que num caso como no outro, este veículo de comunicação foi fundamental para a divulgação dos dois fenómenos, ainda que com propósitos diferentes. Mulher Melancia tornou-se conhecida por via de programas de auditório (e outras fontes também, como a internet) e a Igreja Universal é ela própria dona da Rede Record de televisão, que em 1999 criou como uma filial moçambicana: a TV Miramar . Portanto, estamos diante de um fenômeno de pouco mais de uma década, que por sua vez, remete à abertura política, social e econômica que se deu a partir do início do década de 1990 em Moçambique.


Não se restringindo apenas ao nível macropolítico, esta abertura possui também uma dimensão cultural, se pensarmos que findo o regime socialista monopartidário (em 1992), os moçambicanos passaram a ter acesso a diferentes fontes de informação, para além daquilo que o controle estatal permitia. É justamente aí que se abre espaço para a entrada da Igreja Universal e os seus veículos de comunicação no país. Aliás, é bastante notória a sua ampla penetração em vários países pobres do mundo, certamente em função do seu discurso religioso que apela para as questões cotidianas mais imediatas. Diferentemente da retórica vazia do catolicismo actual, as correntes neopentecostais brasileiras conquistam grande número de fiéis muito em função da linguagem simples e pela promessa de alívio de problemas ligados à pobreza e à desigualdade social.


Porém, os “evangélicos” também são conhecidos em seu país de origem por atos sistemáticos de intolerância religiosa. Desde o famoso incidente do bispo Sérgio Von Helder que em 1995, chutou uma imagem de Nossa Senhora Aparecida em seu programa de televisão na TV Record (“O Despertar da Fé”) até as recentes perseguições a terreiros de candomblé em Salvador, este grupo – especialmente a IURD – tem sido visto com reserva e desconfiança por outros setores da sociedade. Deve-se sublinhar que parte do discurso religioso dos neopentecostais é claramente intolerante, particularmente em relação às religiões afro-brasileiras, o que torna bastante problemática a sua inserção em Moçambique. Há indicações de que essa mesma intolerância se reproduza localmente, em relação à espiritualidade e às religiões africanas, cujas práticas são desqualificadas como “coisas do Diabo”.


Que África é essa?


Paralelamente às questões propriamente religiosas, a atuação da Igreja Universal tem um grande impacto no país devido à grande audiência dos programas do seu canal televisivo. Entretanto, em relação a este episódio em particular, há um dado significativo a considerar; o canal Record News” veiculou uma reportagem bastante positiva sobre a inauguração do templo, inclusive, destacando a audiência do Bispo Macedo com o Presidente da República. E... nenhuma palavra sobre as mortes! Tendo em conta que tratava-se da mesma versão do noticiário exibida no Brasil, dois aspectos chamam a atenção: a despeito da sua longa presença em Moçambique, este foi um dos raros momentos em que a emissora fez uma reportagem sobre o país (com quem tem relações históricas importantes). O outro aspecto inquietante é mais óbvio, mas não custa colocar a pergunta: porquê a emissora não noticiou as mortes? Dada as enormes distorções produzidas pela mídia global em relação ao continente africano, a existência de meios de comunicação in loco – particularmente brasileiros – poderia contribuir para maior troca de informações. Mas não é o que se verifica.


Há um outro “detalhe” não menos importante: na internet, que neste caso, funciona como uma fonte alternativa de informação, a notícia das mortes foi dada pelo site globo.com, da Rede Globo, não por acaso, a principal concorrente da Rede Record. Assim foi apresentada a notícia: “Fiéis morrem em inauguração de templo na África”. Na “África”? Qual é a dificuldade de se dizer que o tal fato ocorreu em “Moçambique”? Este detalhe, aparentemente irrelevante, está na base de toda uma construção ideológica que produz e reproduz desconhecimento sobre a realidade do continente; é justamente esta generalização sistemática que reduz a enorme complexidade das experiências sociais, políticas e culturais africanas. O que vai na contramão das reivindicações do(s) movimento(s) negro(s) brasileiros que, dentre outras conquistas, conseguiram recentemente a introdução do ensino de História da África no currículo escolar oficial .


Este aspecto diz muito sobre o tipo de diálogo que o Brasil pretende estabelecer com países africanos. É certo que colocar o debate dessa forma é inadequado, uma vez que não há uma uniformidade nessa presença do “Brasil”, particularmente em Moçambique. Mestres de capoeira, pastores evangélicos, intelectuais, artistas, grandes empresários, políticos, etc. representam diferentes setores da sociedade que não necessariamente compartilham das mesmas visões de mundo e nem tem a mesma proposta de interação social. Entretanto, a força dos meios de comunicação de massa – muitas vezes ligados a interesses do status quo - acaba por difundir percepções problemáticas sobre a realidade, de ambos os lados. Daí que Carlos Moore (2008), intelectual pan-africanista cubano, defende que este diálogo entre culturas deve se desenvolver privilegiadamente entre a sociedade civil - brasileira e africana(s) – sob paradigmas para além daqueles já existentes nas relações entre o Estado e o grande empresariado.

O Juízo Final


Enfim, pelo que consta, Mulher Melancia e Bispo Macedo não se encontraram, mas diariamente dividem o espaço televisivo que adentra os lares moçambicanos, cada qual à sua maneira. Independente disso, as forças sobrenaturais trataram de separá-los: por volta das 10 horas da manhã de domingo, um forte temporal se abateu sobre a cidade de Maputo e parou justamente em momentos antes da inauguração do tal Cenáculo da Fé. Há quem diga que os Deuses fizeram descer as águas para lavar a “profanação” da noite anterior e abrir caminho para a manifestação do “sagrado” no dia seguinte. Com o sacrifício de duas almas...


Referência bibliográfica

MOORE, Carlos. A África que incomoda: sobre a problematização do legado africano no quotidiano brasileiro. Belo Horizonte: Nandyala, 2008, pp. 59-60.

Monday 16 May 2011

Prezados Membros da Associação Moçambicana de Sociologia (A.M.S)

É com enorme satisfação que vos escrevemos para informar que desde Março de 2011 passamos a ser membros regulares da Associação Internacional de Sociologia (ISA). Como sabeis, havíamos sido admitidos como membros interinos até que os procedimentos legais da nossa inscrição efectiva fossem concluídos. Em meu nome pessoal e do colectivo de direcção da A.M.S endereço os meus parabéns à todos os membros da A.M.S/ISA. Através do hiperligação da ISA (http://www.isa-sociology.org/colmemb/) poderão ter acesso ao blogue da A.M.S. Brevemente a A.M.S vai criar a sua página Web (website), Boletim informativo electrónico e muito possivelmente a sua primeira revista científica, a Revista Moçambicana de Sociologia (RMS).
Saudações
Patrício Langa
O Presidente da A.M.S

Monday 4 April 2011

Ferramentas de Sociologia [7]- FIM.

A direcção da A.M.S em colaboração com o sociólogo Elísio Macamo (que devia ser de leitura obrigatória para quem quer abraçar esta área do saber) vai criar um espaço de debate em torno de alguns conceitos fundamentais da sociologia. Este espaço será dedicado especialmente aos estudantes de sociologia, que podem ser desde pessoas inscritas em cursos de sociologia, docentes, pesquisadores, até leigos. Todo aquele que se interessa pela sociologia enquanto disciplina, ciência e/ou campo de lazer poderá participar no debate. O espaço designa-se “Ferramentas de Sociologia”. Semanalmente iremos postar no blog da A.M.S um texto para reflexão. Todos estão, portanto, convidados a debater. Repetimos, não precisa ser especialista ou ostentar algum grau académico”.
Esta foi o convite que enviamos aos leitores, há algum tempo, para debatermos sobre a nossa profissão. Chegamos ao último número da série: ‘os pontos de vista sobre a sociologia como profissão’. Eventualmente, a série irá prosseguir. Esperamos que os leitores tenham tirado algum proveito dos textos. Entretanto, teria sido muito mais interessante e estimulante se tivessem participado mais activamente no debate. Houve alguma participação no início, mas foi-se enfraquecendo. O que poderá estar por detrás desta fraca participação? Tendes alguma ideia?
Pontos de vista sobre a sociologia como profissão
As causas dão razão? Ou: você estaria a estudar sociologia hoje se Weber não tivesse existido? (7)
Há um exercício simples que gosto de fazer com estudantes. Peço-lhes para levantarem o braço. Geralmente todos levantam. Depois pergunto-lhes porque levantaram o braço. A resposta não se faz esperar: porque eu disse para eles levantarem o braço. Se as coisas da vida fossem assim tão simples! Era só o Elísio dizer “levanta o braço!” e toca daí toda a gente a levantar o braço; ou o Presidente da República dizer aos funcionários das alfândegas “não roubem mais!” e toca daí eles deixarem de roubar; ou o professor de teorias sociológicas dizer “leiam o capítulo I de Economia e Sociedade de Weber para a próxima aula” e toca daí os estudantes atrás do livro na biblioteca para ler o capítulo sobre os conceitos básicos de sociologia. Esse tipo de vida até mete um bocado de nojo. Toda a gente a obedecer, tudo direitinho, que horror! É claro que a vida não é assim. E a razão que faz com que não seja assim responde à pergunta que encabeça o texto: as causas dão razão? Não, não dão.
Vamos por partes. O conceito de causa não é fácil. Há quem julgue que ele esteja no centro do empreendimento científico. Se a função da ciência é explicar fenómenos, então, a ciência não faz outra coisa senão procurar pelas causas dos fenómenos. A composição do júri que delibera sobre esta matéria é bastante heterogénea e ainda não se chegou a veredicto nenhum. Pessoalmente, estou do lado dos jurados que acham que esta visão é demasiado redutora. De qualquer maneira, vale à pena reflectir mais sobre as suas implicações. A noção de causa (causalidade) está presente em muito do que fazemos em sociologia. Na verdade, arrisco uma generalização selvagem para dizer que quanto mais fraco for o sociólogo do ponto de vista metodológico, mais apetência tem ele para explicações causais. Assim, é frequente ouvir por aí quem diga que a causa da corrupção são os baixos salários da função pública, ou o fraco sentido moral dos funcionários, ou ainda o mau exemplo dado pelos chefes. Coisas assim.
Qual é exactamente a estrutura morfológica dum argumento causal? Basicamente, a ligação causal relaciona ocorrências. Coisas, propriedades ou estados não fazem parte desta ligação. Dito de outro modo, só mudanças é que se podem relacionar de forma causal. A decisão de pagar pouco ao funcionário público pode fazer com que um funcionário passe a exigir comissões indevidas (em linguagem caseira: o funcionário vira cabrito e começa a comer onde está amarrado). Dizemos que a ocorrência O é causa da ocorrência P se, e só se O é suficiente para que P ocorra. Por exemplo, se chove O, quem está na rua fica molhado (se não tiver guarda-chuva). Pelo contrário, dizemos que O é uma causa de P se, e apenas se O é necessário, mas não suficiente para que P ocorra. Isto é maneira de falar de filósofos, por isso não se chateiem comigo. Por exemplo, o aumento de preços de produtos alimentares é causa necessária, mas não suficiente para as pessoas irem a rua protestar; os protestos, por sua vez, são causa necessária, mas também não suficiente para que haja pilhagem e vandalismo. O que este exemplo simples mostra é algo especial à sociologia: muitos factos sociais têm múltiplas causas que contribuem para determinados resultados.
Porque levantaram o braço? Porque o professor disse para levantarem o braço. Mas porque levantaram o braço quando o professor disse para levantarem o braço? Porque os estudantes sempre levantam o braço quando o professor diz para eles levantarem o braço. Ai é? Lembram-se do problema da indução? Então? Ah não, não é bem assim (tosse embaraçada), bom, você sabe, é que... Estas são as reacções normais. Há quem levante o braço porque foi bem educado em casa para respeitar as pessoas de autoridade. Há quem levante o braço porque não quer ser o único a não levantar o braço. Há quem levante o braço porque acha que assim cai nas boas graças do professor. Há quem levante o braço por considerar a exortação uma óptima oportunidade de se espreguiçar um bocado. Há quem levante o braço para que o professor não pense que as pessoas de Inhambane têm manias de serem rebeldes. E por aí fora. E notem uma coisa: qualquer uma destas razões pode se desdobrar em muitas outras.
É por causa destas dificuldades que na forma mais dura de sociologia, nomeadamente aquela que quantifica, se dê privilégio à probabilidade. O raciocínio é impecável. Há causas e há o acaso. Se calhar, o acaso pesa mais do que a causa. O acaso é função do acidente ou da coincidência, uma das principais fontes de superstição entre nós. Alunas duma escola construída no terreno que outrora foi cemitério duma linhagem que não foi consultada (quando se construíu a escola), prontos, deve haver uma relação entre os espíritos e os desmaios. É a nossa tradição. É muito complicada. Nós somos africanos. Depois os jornais e a televisão convidam especialistas para pronunciarem longas dissertações sobre aspectos da nossa cultura ancestral. O sociólogo duro considera que o acaso, bem estudado (com a ajuda de estatística que se debruça sobre processos aleatórios) pode revelar padrões. O número de acidentes que ocorrem entre as 2 e as 3 de madrugada na marginal e que envolvem jovens (cuja maioria tirou o carro dos pais sem licença destes) forma um padrão de acidentes que nos pode permitir tirar ilações a respeito da sua distribuição. Quem concluir que a causa desses acidentes é a fúria dos pais (que não foram consultados...) não está a ler bem este texto e muito provavelmente anda aqui perdido.
Mas voltemos ao exemplo do braço para o ar. Não sei se repararam numa coisa muito interessante. É que aquilo que eu apontei como possíveis causas é, bem analisado, algo que está melhor no reino daquilo que chamaríamos de razões. E isto é importante. Já houve filósofos que disseram que causas e razões são uma e mesma coisa (Leibnitz, Descartes e mesmo Spinoza), mas é preciso cuidado com isso. Conforme Max Weber já havia dito há muitas décadas, a sociologia vira a sua atenção analítica para as razões que as pessoas têm para fazerem o que fazem. Ao contrário do que muitos pensam, Weber nunca descartou a importância de causas, embora ele aconselhasse cuidado. O que ele sempre disse foi que a sociologia, ao tentar explicar seja o que for, vai ter que olhar para probabilidades objectivas. Ela faz isso argumentado de forma contra-factual, isto é perguntado como as coisas teriam sido se o que precisa de ser explicado tivesse tido este ou aquele comportamento/manifestação. Este procedimento permite não só avaliar a importância dum determinado evento como também avaliar o peso relativo do que o antecedeu.
Mas o ponto central é que razões pesam mais do que coisas naquilo que o sociólogo tem de considerar como seu objecto. E isso é um grande quebra-cabeças.           

Friday 1 April 2011

Higher Education Master’s in Africa Programme (HEMA): call for applications 2011

UNIVERSITY OF THE WESTERN CAPE

FACULTY OF EDUCATION

HIGHER EDUCATION MASTER’S IN AFRICA

CALL FOR APPLICATIONS 2011



The Higher Education Master’s in Africa Programme (HEMA) is a NORAD-sponsored collaborative programme involving the University of the Western Cape, the University of Oslo, and the Centre for Higher Education Transformation (CHET). HEMA at UWC is a research-based programme (by dissertation) focusing on the changing functions, policies, and operations of Higher Education. Before conducting thesis research, students will take three non-credit modules, viz. Introduction to Higher Education (to be taught at the University of Oslo as part of the Erasmus Mundus European Master’s in Higher Education Programme); Research Methods and Proposal Development; and Higher Education and Development (to be taught at UWC).

Through various disciplinary perspectives, the programme will provide students with a solid basis for analysing and critically assessing change processes at all relevant levels in higher education. This Master’s programme is the first to include a focus on the complex relationship between higher education and development. The programme is linked to a research network on expertise in higher education in Africa, giving successful applicants access to the latest knowledge in the field.

The student target group is those currently involved in or aspiring to become involved in higher education, be it as administrators, researchers, policy-makers, curriculum managers, or consultants.

Scholarships: A number of scholarships are available.
Commencement date: July 2011.

Entrance requirements: a four-year degree (upper second class and above) or its equivalent. Students from non-English speaking countries will be required to provide evidence (certificates) of proficiency in English e.g. TOEFL with at least 550 points (paper-based) or 213 (computer-based), IELTS test with at least 6.0 points, or other qualifications that can be evaluated by the admission committee of the programme. Demonstrated writing ability through the submission of research reports or publications is essential. Practical experience in Higher Education research, administration and/or policy work, would be an added advantage.

Application: Fill in online application via www.uwc.ac.za – choose “M.Ed. (by thesis)” option
and specify “HEMA” under scholarships.
Application deadline: 15 May 2011

For more information and queries regarding the application, please contact Ms Val Koopman at vkoopman@uwc.ac.za; or contact Dr Gerald Ouma at gouma@uwc.ac.za

For other related correspondence/submission of documentation please contact:
Ms Val Koopman
Faculty of Education,  University of the Western Cape
Private Bag X17 Bellville 7535 South Africa

Sunday 27 March 2011

Ferramentas de Sociologia[6]

Pontos de vista sobre a sociologia como profissão
A média age? Ou: porque é que um estudante não choca com um professor? (6)
Um pouco de complicação nunca fez mal a ninguém (esta é uma generalização grosseira). Eis uma. Paul Lazarsfeld, o grande sistematizador da metodologia em pesquisa empírica social, diz que grupos sociais têm aquilo que ele chama de propriedades colectivas. Um grupo social pode ser uma etnia, os alunos duma escola, a direcção duma universidade, um partido político, os vendedores dum mercado, um bando de ladrões, a equipa duma esquadra policial, etc. Propriedades colectivas têm basicamente dois valores (Lazarsfeld fala de três, mas não vou falar da terceira porque é muito complicada para explicar em poucas palavras). Um valor é o que ele chama agregado e o outro é o que ele chama estrutural. Todo o estudante de sociologia sabe o que isto significa. O valor agregado duma propriedade colectiva é uma construção estatística que não tem existência real: a média, mediana e o modo. Tudo artefactos estatísticos que caracterizam colectividades. O estudante de sociologia de universidades privadas de Maputo consome, em média, 35,6 garrafas de cerveja 2M toda a sexta-feira. Este estudante, obviamente, não existe. Mas a afirmação procura caracterizar um grupo específico. O valor estrutural duma propriedade colectiva, por sua vez, refere-se a uma relação. Isto é, alguém é uma determinada coisa em virtude da sua relação com outra coisa. O estudante é estudante porque existe uma categoria que se chama professor. Existe uma camada pobre porque existe uma camada rica. E por aí fora.
Onde está a complicação? Bom, ela está no que a combinação destes dois valores nos permite dizer com segurança sobre a realidade social. Imaginem, por exemplo, a seguinte situação: uma estudante está a caminhar pelo corredor da faculdade. Em sentido oposto vem aí o professor catedrático Pedro Hilário Devaneios. O corredor é estreito, um deles tem que ceder o caminho. PhD parte do princípio de que a estudante sabe quem ele é, e não só, ela sabe que estudante tem que ceder passagem ao professor; a estudante, por sua vez, acaba de ganhar o concurso de Miss Melhor Tese Supérflua, é bela e bem mulher e, acima de tudo, sabe que os homens estão sujeitos ao código das boas maneiras disposto pelo cavalheirismo. Comecem a pegar a cabeça com ambas as mãos, pois a colisão é eminente. Vamos complicar ainda mais. PhD conhece as regras de cavalheirismo, em último minuto dá-se conta de que vem em sua direcção a estudante de quem se fala no bar dos professores (entre assobios), parte do princípio de que ela não vai de certeza se orientar pelo código informal da universidade que dá prioridade a quem tem que acarretar com o peso dos títulos pelo que o mais provável é que ela se mantenha em rota. Faltam 4 passos. A estudante, por sua vez, apercebendo-se de que se trata do grande professor catedrático, famigerado pelo cuidado que ele sempre tem de informar a todos que não o querem ouvir o que significa ser professor catedrático, mas tem o hábito de dar boa nota a estudantes bonitas para demonstrar a imparcialidade dum verdadeiro académico (a tese é: deixa passar mesmo estudantes bonitas), decide que o melhor é mudar de rota. Depois é o BUM, ou não.
John Maynard Keynes, o grande economista britânico que pregou a intervenção correctiva do Estado na economia, uma vez deu um exemplo pertinente. Ele referiu-se a um concurso num jornal que exigia que os concorrentes identificassem as seis caras mais bonitas dum conjunto de cem fotografias. O vencedor seria aquele cuja escolha estaria mais próxima da média de preferências de todos os concorrentes. Já podem imaginar o problema. Para ganhar, não posso partir do princípio de que as minhas preferências estarão próximas da média. Para ter hipóteses de ganhar tenho que escolher aquelas caras que eu acho que correspondem à média. Mais um problema aqui, pois os outros vão pensar a mesmíssima coisa (se forem indivíduos racionais). O mais seguro para ganhar não é nem escolher as caras que considero mais bonitas, nem as que considero serem próximas da média. O mais seguro é antecipar o que a opinião média considera ser a opinião média. Mais seguro ainda é considerar o que a opinião média considera que a opinião média considera ser a opinião média. E por aí fora. Complicado.
O mais incrível, porém, é que estudantes raramente chocam com professores. Porquê? Provavelmente porque, apesar de tudo, o senso-comum intervém de forma forte na regulação do nosso quotidiano. Alguns de nós gostam de sugerir que o sociólogo é aquele que ultrapassa o senso-comum. Bom, é verdade, mas também não. O sociólogo deve procurar entender a estrutura deste senso-comum e como ele se manifesta no comportamento dos indivíduos. A sociedade produz-se a si própria e é pelos seus meios que também resolve tudo que é problema. O sociólogo não estuda a sociedade para ajudá-la a resolver seja o que for. Estuda-a para perceber como ela se produz e reproduz (criando e resolvendo problemas). Se é que a sociedade existe, claro.
Colaboração: Elísio Macamo.